O cinema sempre foi um reflexo da evolução tecnológica, mas algo inédito aconteceu no Oscar 2025: dois filmes que usaram inteligência artificial para modificar performances de atores não só receberam indicações, mas também venceram categorias importantes. The Brutalist e Emilia Pérez entraram para a história ao assumir que utilizaram IA para aprimorar vozes. No caso de The Brutalist, a tecnologia também foi usada para ajustar o sotaque húngaro de László Tóth, interpretado por Adrien Brody. Isso representa um salto para a indústria ou um retrocesso para a autenticidade da atuação? No futuro, a IA será aceita como uma nova expressão da arte no cinema?
A polêmica cresceu ainda mais quando se descobriu que as produções só admitiram o uso dessas tecnologias depois das indicações. Se ninguém tivesse admitido, será que o público teria percebido? Essa nova realidade levanta uma questão urgente: a arte está realmente incorporando a IA de forma criativa, ou estamos simplesmente cedendo à perfeição artificial em detrimento do talento humano?
Atores ou algoritmos? A tecnologia nos bastidores do Oscar
Em The Brutalist, o uso da inteligência artificial garantiu que Adrien Brody e Felicity Jones soassem como falantes nativos de húngaro. No entanto, em um passado não tão distante, atores passavam meses ou até anos aperfeiçoando sotaques para dar credibilidade a seus papéis. Mas agora, com a tecnologia Respeecher, um ator pode falar qualquer idioma sem precisar estudá-lo. Já em Emilia Pérez, a protagonista Karla Sofía Gascón teve sua performance vocal modificada digitalmente para alcançar notas que sua voz original não conseguiria. O resultado? Uma interpretação aprimorada ao extremo, mas que nunca existiu de verdade.
Essa não foi a primeira vez que Hollywood usou tecnologia para moldar atuações. Em Vingadores Guerra Infinita, A Marvel utilizou captura facial avançada e técnicas computacionais para recriar digitalmente as expressões de Thanos, interpretado por Josh Brolin, em CGI. Em Tron O Legado, Jeff Bridges foi digitalmente rejuvenescido. Mas, enquanto a indústria usava essas tecnologias para criar personagens fictícios, agora elas estão refinando performances humanas. E isso muda tudo.

Captura facial e aprendizado de máquina para CGI
Hollywood já decidiu: o futuro será artificial?
Do Protesto à Premiação: IA e a Nova Era da Atuação
A greve dos roteiristas e atores de 2023 não apenas alertou para os perigos do uso descontrolado de IA na indústria, mas também garantiu que a tecnologia só poderia ser usada com consentimento dos artistas. Na teoria, parecia uma vitória; no entanto, na prática, as produções estão encontrando brechas para implementá-la sem que os profissionais tenham total controle sobre suas próprias imagens e vozes. Relatos de atores sendo obrigados a realizar escaneamentos corporais completos sem saber como esses dados serão usados no futuro mostram que as preocupações estavam longe de ser exageradas.
O mais curioso é que a própria Academia do Oscar 2025, ao premiar The Brutalist e Emilia Pérez, pode ter sinalizado uma nova era na atuação. Se performances aprimoradas por IA podem competir de igual para igual com atuações 100% humanas, o que impede que estúdios passem a considerar a criação de atores digitais para reduzir custos e otimizar performances?
A polêmica ficou ainda maior com a vitória de Karla Sofía Gascón sobre Fernanda Torres na categoria de Melhor Atriz. Enquanto a atuação da brasileira em Ainda Estou Aqui foi totalmente natural, a performance de Karla Sofía Gascón foi aprimorada digitalmente para alcançar registros vocais impossíveis sem o auxílio da IA. Isso levanta uma questão inevitável: como medir justiça em uma disputa onde um ator compete apenas com seu talento e outro tem o suporte da tecnologia?
James Cameron, Disney e o Caminho da IA no Cinema
Esse debate não se restringe ao Oscar 2025. À medida que a indústria do cinema abraça cada vez mais a inteligência artificial, diretores e estúdios começam a explorar novas formas de integrar essa tecnologia em suas produções. James Cameron já demonstrou interesse na revolução da IA, ingressando no conselho da Stability AI para explorar seu impacto no cinema. Enquanto isso, a Disney passou a investir em tecnologias avançadas de rejuvenescimento digital, incluindo deepfakes, como visto no retorno de Luke Skywalker em The Book of Boba Fett. Embora a Lucasfilm não use oficialmente esse termo, a técnica aplicada se assemelha ao deepfake e marca um avanço na criação de personagens digitais.

James Cameron, diretor de cinema ingressou na Stability AI

Cena de Luke Skywalker em The Mandalorian, recriado com tecnologia deepfake
Até onde a tecnologia pode ir sem destruir a essência do cinema?
Atores costumavam se transformar para seus papéis e Christoph Waltz não foi diferente: ele aprendeu quatro idiomas para interpretar o vilão de Bastardos Inglórios. Já Daniel Brühl precisou aprimorar seu francês para atuar no mesmo filme. Hoje, com um clique, qualquer ator pode parecer dominar uma língua sem nunca ter estudado uma única palavra. Isso é progresso ou apenas uma forma de atalho que desvaloriza a dedicação humana?
O impacto da IA não se restringe à atuação; pelo contrário, softwares como Jukebox AI podem criar músicas inéditas sem a necessidade de músicos ou compositores. Além disso, a indústria de dublagem já sente os efeitos dessa revolução, com ferramentas que replicam vozes com alta precisão. Dessa forma, quanto mais a tecnologia avança, mais ficamos diante da mesma pergunta: o que ainda distingue um artista de um algoritmo?
O Oscar 2026 premiará a melhor IA?
Se a tendência continuar, é possível que a Academia precise criar uma nova categoria para reconhecer o uso de IA nas produções. Mas será esse o caminho ideal? Festivais de cinema já debatem os limites éticos dessas inovações, e alguns recusam filmes feitos inteiramente por IA. No entanto, os avanços são irreversíveis, e o público terá um papel crucial na decisão de aceitar ou rejeitar essa nova fase da sétima arte.
Você assistiria a um filme sabendo que a performance do protagonista foi artificialmente aprimorada? Ou prefere que a imperfeição humana continue sendo a alma do cinema? O que parecia um futuro distante já está acontecendo. À medida que IA no Cinema se torna uma realidade, a resposta para essa questão pode definir os próximos anos da indústria cinematográfica.