A série Ruptura (Severance, no original) pode até parecer só mais um drama psicológico com estética de escritório minimalista. Mas se você prestar atenção de verdade, vai perceber que ela planta sementes conflituosas sobre nossa relação com o trabalho — especialmente se você for o tipo de pessoa que começa a pensar demais.
Isso porque, mais do que contar uma boa história, a série Ruptura critica o trabalho de forma profunda e simbólica, expondo o que muitas empresas preferem esconder.
E, se você trabalha em uma empresa tradicional, seu chefe provavelmente não vai curtir essa ideia.
Aqui vão 10 motivos pelos quais assistir Ruptura pode causar desconforto no alto escalão da sua firma.
1. Você começa a questionar a separação entre “vida pessoal” e “vida profissional”
“Bem, toda vez que você se encontra aqui, é porque escolheu voltar.”
“Well, every time you find yourself here, it’s because you chose to come back.”
— Mark Scout
A série leva a sério o conceito de separar quem você é no trabalho de quem você é fora dele. Literalmente.
Mas depois de um tempo, o que parece uma boa solução para equilíbrio vira uma crítica profunda ao modelo corporativo que exige personas sacrificadas em nome da produtividade.
2. Ela escancara a cultura do controle disfarçado de “ambiente organizacional”
“Eu sou uma pessoa. Você não é. Eu tomo as decisões. Você não.”
“I am a person. You are not. I make the decisions. You do not.”
— Helena
Códigos de conduta, salas minimalistas, discursos motivacionais, recompensas simbólicas…
À medida que a série avança, tudo isso começa a soar estranhamente familiar.
No entanto, em Ruptura, a distopia não se esconde. Pelo contrário, ela se revela com clareza, o que, por consequência, pode fazer você perceber como, no mundo real, ela apenas se disfarça melhor.
3. A ideia de “empresa como família” vira motivo de riso nervoso
A Lumon prega lealdade cega, quase religiosa. Logo quem assiste percebe que, quando o chefe diz “aqui somos uma família”, isso pode vir com obrigações que você não teria nem com sua família de verdade.
4. Você pode perder o encanto com os brindes de final de ano
“A experiência de dança musical está oficialmente cancelada.”
“The Music Dance Experience is officially canceled.”
— Seth Milchick
Festas como a Waffle Party, o Defiant Jazz, além das fotos na parede: a série mostra como rituais corporativos podem ser usados para mascarar um ambiente opressor. Dessa forma, a crítica à cultura organizacional se intensifica. A partir dessa perspectiva, até o happy hour pode parecer parte de uma coreografia programada.
5. A palavra “propósito” começa a soar esquisita
“O trabalho é misterioso e importante, e lidamos com a incerteza que isso traz… juntos, como uma família.”
“The work is mysterious and important, and we deal with the uncertainty it brings us… together as a family.”
— Mark Scout
Afinal, qual o verdadeiro propósito do seu trabalho?
Em Ruptura, nem os próprios funcionários sabem o que estão fazendo — e a empresa prefere que continue assim.
Assista dois episódios e você já começa a desconfiar daquelas apresentações de PowerPoint sobre “missão e valores”.
6. A estética do escritório começa a parecer propositalmente alienante
“O inferno é apenas o produto de uma imaginação humana mórbida. A má notícia é que tudo o que os humanos podem imaginar, geralmente conseguem criar.”
“Hell is just the product of a morbid human imagination. The bad news is whatever humans can imagine they can usually create.”
— Sra. Cobel
Pisos infinitos, iluminação branca, móveis padronizados.
De repente, o visual da sua empresa deixa de ser neutro e passa a ser um lembrete silencioso de vigilância e conformidade.
7. O RH começa a parecer um braço do setor de manipulação
“Se quiser um abraço, vá para o inferno e encontre sua mãe.”
“If you want a hug, go to hell and find your mother.”
— Harmony Cobel
Depois de ver o que a Sra. Cobel é capaz de fazer sob o disfarce de “recursos humanos”, fica difícil não enxergar algumas ações do RH real como formas sutis de controle emocional.
8. Você percebe que autonomia pode ser uma ilusão
“A maneira mais eficaz de domar um prisioneiro é deixá-lo acreditar que é livre.”
“The surest way to tame a prisoner is to let him believe he’s free.”
— Harmony Cobel
No mundo real, o funcionário costuma sentir que tem liberdade. Afinal, foi ele quem escolheu estar ali e aceitou seguir regras em troca do trabalho.
Mesmo assim, essa liberdade é relativa. Em muitos casos, foram as circunstâncias da vida que o empurraram para aquela situação.
Na série Ruptura, essa ausência de escolha fica ainda mais evidente. Os internos não têm qualquer poder de decisão. Apenas cumprem ordens, sem nem mesmo saber quem são.
9. A série desperta empatia por quem você costuma ignorar
“Tenho certeza de que você permanecerá comigo em espírito, em algum canto profundo e completamente inacessível da minha mente.”
“I am certain you will remain with me in spirit, in some deep and yet completely unaccessible corner of my mind.”
— Burt
Ao mostrar a jornada dos “inters” (funcionários em estado de ruptura), Ruptura humaniza até as figuras mais apagadas do escritório.
Como resultado, isso pode te fazer repensar como trata seus colegas — e como é tratado.
10. Ela te faz imaginar um mundo onde o trabalho não define quem você é
“Nosso trabalho é provar que somos pessoas, não apenas partes de uma máquina.”
“Our job is to prove we’re people, not just parts of a machine.”
— Ricken
Essa talvez seja a ideia mais perigosa de todas.
Porque, se você começa a ver o trabalho como apenas uma parte da vida, e não o centro dela, talvez também comece a querer mudanças. E isso, do ponto de vista do seu chefe, pode ser inaceitável.
Conclusão
Se você ainda não assistiu Ruptura, vá em frente — mas esteja avisado: essa série pode alterar permanentemente a forma como você enxerga o seu emprego.
Afinal, a série Ruptura critica o trabalho com tanta precisão que talvez você nunca mais veja o ambiente corporativo da mesma forma.
E se seu chefe perguntar o que você achou… talvez seja melhor dizer que achou “interessante”, e mudar de assunto.